quarta-feira, 21 de outubro de 2009

TRÊS OBRAS-PRIMAS E O MELHOR DO CINEMA ANTI-COLONIAL FRANCÊS NO PRIMEIRO DIA DA MOSTRA


















foto: África 50 
No dia 27/10/2009, que marca o ínicio da nossa mostra, exibiremos, na Aliança Francesa, na sessão das 18h (reprise no sábado, 16h, na Aliança Francesa), três clássicos do cinema francês realizados por quatro grandes cineastas franceses: Jean Rouch, Chris Marker, Alain Resnais e René Vautier. São filmes preliminares que, cada um a sua maneira, contém em si as tensões do momento pré-libertação das colônias, compondo um pequeno panorama de olhares cruzados. O filme de Vautier, África 50, é o primeiro manifesto anti-colonial francês, que foi censurado e re-censurado durante muitos anos. Por conta desse filme, Vautier foi condenado a 1 ano de prisão (consulte a sinopse). Também obscurecido, durante anos, pela censura, As estátuas também morrem, obra-prima de Alain Resnais e Chris Marker (consulte a sinopse)., questiona através de um texto lúcido e provocante a recuperação ocidental da arte africana, oferecendo subsídios para pensarmos a própria situação do cinema feito na África pós-colonial. Mais conhecido e polêmico, Mestres loucos, de Jean Rouch (consulte a sinopse )., é uma das obras primas do cineasta-etnólogo, em que seu “cine-transe” se expressa de maneira marquante. 

I. Às vésperas da libertação: a questão colonial no cinema francês | Programa 1 (79’):

África 50, René Vautier, 1949, 20’  

África 50, de René Vautier, é um dos raros testemunhos cinematográficos da violência do sistema colonial francês na África. 
Câmera na mão, René Vautier, a pedido da Liga do Ensino, parte, em 1949, para filmar as condições de vida nas aldeias das colônias da África Ocidental Francesa, com o objetivo de criar conteúdos etno-pedagógicos. Revoltado com os desastres humanos causados pela ideologia colonial e a aculturação forçada das etnias locais em resistência, Vautier rompe muito rapidamente com a delegação comandada pelos representantes do governo. Ele é expulso oficialmente da África, mas foge e filma clandestinamente os vestígios da repressão na Costa do Marfim. De volta à França, depois de múltiplas peripécias, ele monta África 50 com um quarto das películas então capturadas (o restante foi confiscado pelo governo francês).  O diretor será condenado a um ano de prisão e o filme será censurado durante mais de quarenta anos, mas será apoiado de maneira semi-clandestina nas redes alternativas. Em 1997, o Ministério das Relações Estrangeiras envia uma carta a René Vautier, especificando que “ uma comissão decretou que era útil para o prestígio da França mostrar, através desse filme, que nos anos 50 existia no nosso país um sentimento anticolonialista pronunciado”.

As estátuas também morrem, Alain Resnais e Chris Marker, 1953, 29’
Junto com África 50, As estátuas também morrem, de Alain Resnais e Chris Marker, é a pedra fundamental de uma vanguarda anticolonialista do cinema francês. Através da arte africana, mais especificamente das estátuas e das máscaras, Resnais e Marker filmam uma virulenta diatribe contra os insuspeitáveis crimes do colonialismo sobre as criações africanas: a especificidade da cultura panteísta e mágica é substituída, pouco a pouco, por uma atividade artística comercial mercantil e de série. As estátuas também morrem foi proíbido pela censura de 1953 a 1963. 
“(…) eles sabiam tudo que se passava na África e nós fomos mesmo muito delicados em não ter evocado as aldeias queimadas, coisas assim; eles estavam totalmente de acordo com o sentido do filme, só que (é aí que a coisa fica interessante) esse tipo de coisa podia ser dita em uma revista ou jornal, mas no cinema, mesmo que os fatos fossem exatos, nós não tínhamos o direito de fazê-lo. A proibição teve consequências muito graves para o produtor. Quanto a nós – seria um acaso ? –, nem Chris Marker nem eu recebemos propostas de trabalho durante três anos”.
(Alain Resnais, sobre sua entrevista com dois dos representantes da comissão de censura)

Mestres loucos, Jean Rouch, 1955, 30’
Rodado em apenas um dia, o filme mostra as práticas ritualísticas do culto Hauka. Baba, tremores, respiração ofegante… são os signos da chegada dos “gênios da força”, personificação emblemática da dominação colonial: o guarda, o governador, o doutor, a mulher do capitão, o general, o condutor de locomotiva, etc. A cerimônia atinge seu ápice com o sacrifício de um cachorro que será comido pelos possuídos. No dia seguinte, os iniciados retornam às suas ocupações cotidianas. Muito controverso, este filme é emblemático do “cine-transe” criado por Jean Rouch. Segundo Ousmane Sembene e Med Hondo, Rouch filma os africanos como insetos.  

II. A liberação do olhar: o nascimento do cinema africano | Programa 2 (105’):

África sobre o Sena, Paulin Vieyra, Jacques Melokane e Mamadou Sarr1957, 21’
Sem poder obter a autorização de filmar no seu próprio país, um grupo formado pelos primeiros alunos africanos do IDHEC (Institut des Hautes Études Cinématographiques) dirigiu na França aquele que foi o primeiro filme verdadeiramente africano. África sobre o Sena mostra a vida de estudantes africanos em Paris. No final do filme, uma imagem “roubada” de crianças brincando em um rio do Senegal explicita a força da proibição colonial imposta aos africanos de fabricar suas próprias imagens, as imagens de sua própria terra.

Borom Sarret – o carroceiro, Ousmane Sembene, 1962, 19’
Com essa pequena fábula que nos conta a história de um pobre carroceiro que, por ter ousado circular nos bairros ricos de Dakar, tem sua carroça confiscada, Sembene tece o retrato dessa cidade, uma cidade pós-colonial, dividida por fronteiras de classe. O filme tornou-se um acontecimento para o cinema africano. Realmente, pela primeira vez, uma imagem da África vista de dentro nos é proposta. Borom Sarret é o primeiro filme rodado na África, e é também o primeiro filme deste que seria o primeiro cineasta de envergadura do cinema negro-africano.  

A negra de…, Ousmane Sembene, 1966, 65’ 
Com A negra de…, o primeiro longa-metragem realizado por um cineasta da África negra, Ousmane Sembene se afirma como “o mais velho dos antigos” do cinema africano. 
Em Dakar, Diouana, uma jovem senegalesa, é contratada como empregada doméstica por uma família de brancos. Quando a família volta à França, Diouana os acompanha. Cada vez mais mal tratada pelos empregadores, ela pensa em suicídio. Ousmane Sembene repousa seu olhar sobre a solidão dessa mulher africana no meio de uma cultura “outra” e de indivíduos marcados pelo colonialismo.
“Eu desejava denunciar três realidades: 1o) O néo-colonialismo francês que persiste, de uma forma nova, com o ‘tráfico de negros’; 2o) A nova classe africana, sua cúmplice, e 3o) Uma certa forma de cooperação técnica entre os dois.” (Ousmane Sembene)

III. A tomada da palavra: Oumarou Ganda, de objeto a sujeito | Programa 3 (73’):


Euum negro, Jean Rouch, 1959, 73’
Euum negro conta uma semana na vida de um grupo de jovens migrantes nigerianos em Treichville, bairro pobre de Abdijan. O narrador e herói desta história é Edward G. Robinson, apelido de Oumarou Ganda. Ganda e seus compatriotas tomam a palavra para comentar suas vidas. Indo além do cinema etnográfico, Jean Rouch faz aqui o que ele mesmo chama de “etnoficção”, um híbrido entre o filme etnográfico e o cinema de ficção. Euum negro foi celebrado por Jean-Luc Godard como uma “revolução cinematográfica”. 
Jean Rouch : “pela primeira vez na história do cinema, um africano teve o direito à palavra, o direito de dizer tudo e de fazer tudo”.
Oumarou Ganda: “Eu sentia que a realização daquilo que eu pensava devia ser diferente, porque, na realidade, eu era também um pouco co-diretor deste filme. Eu trazia a minha parte a cada dia, nós trabalhamos juntos e depois Rouch fez a montagem...”.

Programa 4 (86’):

Cabascabo, Oumarou Ganda, 1969, 48’.
Obra autobiográfica, Cabascabo é o primeiro filme dirigido por Oumarou Ganda. Onze anos depois de Moi, un noir, Ganda, de alguma maneira, responde ao filme de Jean Rouch, encenando sua própria história: a história do retorno à casa de um soldado africano que lutou pela França na guerra da Indochina. 
“Oumarou Ganda conseguiu simplesmente manifestar a própria alteridade do africano. Alteridade que reforça (a mil léguas de qualquer folclore, anedota, etc.) linguagens e condutas exatamente como são faladas e filmadas: o que se dizia dos westerns de Anthony Mann ou de Hawks, a rigor, poderia ser uma referência aqui: a câmera está ali, os atores estão ali e isso é tudo. Nem preocupação formal, nem dramatização ou distância : presença na presença, a linearidade do presente.” (Jean-Louis Comolli)

O Wazzou polígamo, Oumarou Ganda, 1970, 38’
Um fiel muçulmano, retornando de Meca, adota o título de “El Hadj”1. Ele não se constrange, no entanto, em cobiçar a jovem Satou, destinada a Garba.  Este, furioso, não tem o que fazer senão deixar a aldeia, indo para a cidade. Mas um drama maior explode : a segunda esposa do Hadj, Gaika, não aceita a intrusa e, para impedir o casamento, decide matá-la durante a noite que precede às núpcias.
“Como no seu primeiro filme, em que ele se inspirava na sua própria vida, Oumarou Ganda, bom observador de sua sociedade, inspirou-se em um fato real para escrever o roteiro de O Wazzou polígamo. Através deste filme, Ganda denuncia a poligamia, mas também aqueles que detêm ou pensam deter de uma maneira ou de outra o poder”. (Achille Kouawo)
Prêmio Sementais de Yennenga FESPACO 72; Prêmio da Crítica International do Festival de Dinard 1972.


IV. A reapropriação da história: colonização, invasões e resistências | Programa 5 (95’):

Emitaï, Deus do trovão, Ousmane Sembene, 1971, 95’
Em 1942, durante a Segunda Guerra Mundial, em uma aldeia da Casamande, no Senegal, os Diolas recusam a intervenção externa. Uma parte dos homens da aldeia foi enviada, à força, ao front franco-alemão. O coronel Armand e seu exército colonial devem requisitar arroz para enviar às tropas. Responsáveis pelas colheitas, as mulheres decidem, desta vez, resistir e esconder o arroz. 
Segundo uma lógica marxista, que considera a religião como refúgio da opressão, Sembene opõe a resistência ao culto dos deuses, notadamente, de Emitaï, o « Deus do trovão ». Esta oposição aparentemente simplista é, no entanto, carregada de ambivalência. 
“Em um sentido, Emitaï é também um filme contra a negritude, essa ideologia mistificadora. É igualmente um filme que exalta a cultura popular como fator de resistência”. (Ousmane Sembene)

Programa 6 (90’):

Ceddo, Ousmane Sembene, 1977, 90’
O filme se situa no século 17, no momento em que o Islã e o cristianismo penetram na África Ocidental. Para as duas religiões, todos os meios são válidos para encher a mesquita ou a igreja. O Imã, depois de converter a família real e os grandes dignitários, entra em choque com a recusa dos “Ceddos”. “Ceddo” é o nome dado a um grupo de indivíduos que se opuseram à penetração do Islã para não perder sua identidade cultural. 
“Eu quis, sobretudo, que este fosse um filme de reflexão, para que nós, africanos, tenhamos a coragem de tentar refletir sobre nossa própria história e os elementos que nós recebemos do exterior, e para que nós paremos de fazer filmes para chorar a nossa miséria ou solicitar a condescendência dos outros”.  (Ousmane Sembene)

Programa 7 (79’):

Tabataba, Raymond Rajaonarivelo, 1987, 79’
Em 1947, os habitantes da aldeia de Tanala, na costa leste de Madagascar, envolvem-se na grande revolta contra a colonização francesa. A história da insurreição e de sua repressão é vivida através dos olhos de Solo, um garoto cuja vida cotidiana e infância são abaladas para sempre. 
“Em Tabataba, a chegada dos soldados provoca a suspensão de todos os sons. Os barulhos da floresta dão lugar artificialmente ao puro silêncio, que só é perturbado pelo martelar dos passos. Um contraponto se instala entre imagem e som. O espectador é tomado por um sentimento complexo que o obriga a refletir » (Olivier Barlet)

Programa 8 (120’):

Sarraounia, Med Hondo, 1986, 120’
Em uma aldeia da África, um ancião confia sua filha a seu amigo. Com esse pai adotivo, ela aprende o manuseio das armas, as verdades sobre a vida, o contato com os espíritos. Quando se torna mulher, Sarraounia assume a chefia dos Aznas. Rainha, ela não busca a dominação, mas batalha pela independência e pela paz, enfrentando o exército colonial que, composto por nativos, parte do Sudão francês, em 1899, e avança para conquistar o sul. Os soldados acreditam na invencibilidade da rainha; eles sabem que ela é protegida pelos deuses e entidades espirituais, e querem retornar ao Sudão. 
Trata-se do primeiro filme épico africano, através do qual Med Hondo aborda a luta contra o império colonial francês, associando resistência e espiritualidade.
Prêmio Sementais de Yennenga - FESPACO 1987

Programa 9 (76’):

Jom ou a história de um povo, Ababacar Samb Makharam, 1981, 76’
O Jom é  a origem de todas as virtudes, a dignidade, a coragem, uma certa beleza do gesto, a fidelidade ao compromisso, o respeito ao outro e a si mesmo. Khaly, o griô, encarnação da memória africana, atravessa as épocas para testemunhar a resistência à opressão, aquela que opõe o colonizador ao povo subjugado, o senhor ao empregado, o patrão da fábrica aos operários. 
O modo de contar do griô contamina a narrativa fílmica, que atravessa temporalidades distintas, compondo uma ode à resistência.

V. Diáspora 1: Exílio | Programa 10 (89’):




fotos:Touki Bouki


Touki Bouki, Djibril Diop-Mambéty, 1973, 89’
Mory, jovem vaqueiro que vem a Dakar para vender seu gado nos abatedouros, encontra Anta, uma estudante revolucionária. Os dois procuram, por todos os meios, dinheiro para partir para Paris. Depois de numerosas peripécias, eles se encontram sobre a ponte de um navio que parte para a França. Mas, no último momento, Mory se recusa a fugir em direção a uma nova miragem.
Com Touki Bouki, seu primeiro longa-metragem, Djbril Diop-Mambéty rompe com os modos de representação clássicos realistas e constrói um road movie onírico sobre a marginalidade dos jovens que tentam encontrar um destino. Frequentemente comparado às obras-primas da Nouvelle Vague, como Pierrot, le fou e AcossadoTouki Bouki é um filme moderno, cujas imagens alucinantes e montagem em espiral exprimem uma escritura fílmica cheia de criatividade e estilo. Ele será citado com frequência pelos cineastas africanos como uma primeira referência. 
Touki Bouki é um filme profético. Seu retrato da sociedade senegalesa de 1973 não é diferente da realidade de nossos dias. Centenas de jovens africanos morrem todos os dias no estreito de Gibraltar, tentando chegar à Europa. Quem nunca ouviu falar dessas histórias antes? Touki Bouki é um filme belo, inquietante e surpreendente, que faz com que nos questionemos.” (Souleymane Cissé)

Programa 11 (102’):

Sol Ô, Med Hondo, 1969, 102’
Um imigrante negro chega a Paris, “ao país de seus ancestrais gauleses”. Ele tem muitas dificuldades para achar um trabalho, um alojamento. Mais do que uma denúncia das condições de vida dos imigrantes e das sequelas políticas, econômicas e sociais da colonização, Sol Ô, o primeiro longa-metragem de Med Hondo, é um ensaio virulento, com um discurso agudo e liberdade formal.

Programa 12 (117’):

Concerto para um exílio, Désiré Écaré, 1967, 42’
Concerto para um exílio é o retrato de quatro tipos de exilados africanos na França. Trata-se de uma certa categoria de africanos migrantes – os estudantes, os intelectuais, os refugiados políticos etc. –, que viveram muitos anos longe da África, e para os quais a reinserção em seus países de origem é muitas vezes difícil. Eles sentem constantemente a necessidade de partir. Mas partir para onde?
“Esta dor que nós todos sentíamos no momento em que a lembrança de nossa situação de exilados nos acordava de uma euforia passageira. Ainda que nós não tivéssemos ilusão sobre a África que nos esperava.” (Désiré Écaré)

A nós dois, França, Désiré Écaré, 1970, 75’
Um africano fantasiado com uma vestimenta de gentleman se autodenomina Tarzã. Ele é casado com uma francesa chamada França.  Sob sua aparência afetada e sua máscara branca, Tarzã sente constantemente vibrar em si o chamado da África. Esta é simbolizada pela sua amante africana. 
Désiré  Écaré nos oferece com esse filme uma dose deliciosa de seu humor delirante, através do qual ele constroi um retrato satírico das relações de amor e de poder entre franceses e africanos. Os personagens e as relações entre seus corpos e a cidade de Paris impregna o filme de uma energia rítmica especial.

Programa 13 (90’):

AFRANÇA, Alain Gomis, 2001, 90’
Filmado em vídeo, Afrança conta a história de El Hadj, um estudante africano em Paris. Para ele, voltar ao Senegal para participar do desenvolvimento do país é um dever. Mas este futuro é violentamente posto à prova pela realidade da sua vida na França. 
Afrança é essa contração entre a África e a França, é esse território que não existe, esse mundo mental, mistura de lembranças e esperanças, esses restos da África reconstituídos na França.
 Afrança é também esse “A” de privação, porque finalmente isso não é realmente a França, mas também porque é a França que não se mostra. 
Se me parecia importante que a ficção abordasse os lugares e as populações tão pouco representados no país onde eu nasci, minha vontade profunda era de fazer um filme sobre um Homem. Eu não queria fazer um filme sobre um Negro no país dos Brancos, mas justamente sobre alguém que pudesse dizer: ‘eu estou cansado de ser ‘black’, eu sou senegalês’. Eu estava cansado de ver todos esses africanos retratados quase exclusivamente em uma relação de dependência com o Ocidente, lutando para entrar ou ficar em um país ocidental. Eu queria um personagem que batalha para voltar, como os tantos que eu via.” (Alain Gomis)

VI. Diáspora 2: O trânsito | Programa 14 (109’):


Bako, a outra margem, Jacques Champreux, 1978, 109’ 
Este filme narra o lento mergulho na miséria, no desespero e, às vezes, na morte, por que passam, a cada ano, milhares de homens hipnotizados pela miragem de “Bako”, palavra bambara que significa “a outra margem”, empregada pelos imigrantes clandestinos malienses para designar a França.
Datado dos anos 1970, esta narrativa do périplo de um jovem maliense, que deixa sua aldeia para tentar chegar à França, é de uma atualidade espantosa. 

Programa 15 (99’):

Outubro, Abderrahmane Sissako, 1992, 38’
Ira espera um filho. Ela se preocupa, ela está em dúvida e perambula pelas ruas de Moscou. Seu namorado, Idrissa, um estudante africano, deixará  a Rússia. Ele vai para o apartamento de Ira para um último encontro. Uma última noite de outubro. 
Tendo estudado cinema em Moscou, Abderrahmane Sissako demonstra de maneira inaugural a influência das experiências autobiográficas em suas narrativas, o que se tornará uma das marcas de seu estilo cinematográfico. 
“A Rússia era um país difícil. Eu tinha necessidade de fazer um filme que me permitisse partir”. (Abderrahmane Sissako)

Heremakono: esperando a felicidade, Abderrahmane Sissako2002, 92’
Abdallah, um menino, encontra sua mãe em Nouadhibou, cidadezinha da costa da Mauritânia, enquanto esperam para viajar para a Europa. Nesse lugar de exílio, cuja língua não entende, tenta decifrar o mundo que o rodeia: Nana, mulher sensual que tenta seduzi-lo, Makan, que quer partir como ele, Maata, ex-pescador transformado em eletricista e seu aprendiz, o jovem e alegre Khatra que o ajudará a sair de seu isolamento ensinando-lhe o dialeto local.
Os destinos cruzam-se e descruzam-se, enquanto os olhares fixos no horizonte esperam uma felicidade hipotética.
Seleção oficial: Un Certain Regard, Cannes 2002
Prêmio da Crítica Internacional, Cannes 2002
Étalon de Yennenga Fespaco 2003

VII. Diáspora 3: O retorno | Programa 16 (110’):



fotos: Hienas
Hienas, Djibril Diop-Mambéty, 1992, 110’
Linguère Ramadou volta a Colobane, pequena aldeia do Sahel, depois de 30 anos de ausência, durante os quais ela fez fortuna. Ela está pronta a cobrir a aldeia de generosas doações, sob a condição de que o homem que provocou a sua infelicidade, negando, com o apoio de testemunhas subornados, ser o pai de seu filho, seja condenado à morte. Os habitantes de Colobane se opõem, a princípio, ao propósito da velha senhora, mas tornam-se rapidamente sensíveis à sua generosidade... Adaptação da peça de teatro de Friedrich Durrenmatt “A visita da velha senhora”.
“Uma história dura e pungente, magnificamente filmada.”  (Catherine Ruelle)

Programa 17 (75’):

Férias em casa, Jean-Marie Teno2000, 75’
Uma viagem ao Camarões é a oportunidade, para o diretor, de se interrogar sobre a noção de desenvolvimento e de modernidade na sociedade camaronense, que prega que o que vem do ocidente é moderno, enquanto o que é produzido localmente é arcaico e condenado ao desaparecimento. 
“O fato de viver no exterior permite, quando voltamos ao nosso país, que nos demos conta da dimensão das transformações. No nosso país, nós não nos damos tanto conta da mudança. As próprias pessoas mudam e não se dão conta.” (Jean-Marie Teno)

Programa 18 (74’):

E não nevava mais, Ababacar Samb Makharam, 1965, 22’
Um jovem bolsista senegalês volta da França. O que ele aprendeu? O que ele esqueceu? Que via ele vai escolher quando entrar em contato com as novas realidades africanas? Os problemas que se colocam para a juventude africana são expostos com franqueza, coragem e humor.

Questão  à terra natal, Samba Félix Ndiaye, 2006, 52’
Depois de muitas décadas de exílio, o documentarista senegalês Samba Félix Ndiaye volta ao seu país natal e se questiona sobre o destino do continente africano. Em buscas de respostas, ele percorre a África do Oeste, encontrando economistas, homens políticos e intelectuais. 
“Félix coloca suas questões no tom do ‘diário de viagem ao país natal’ de Césaire. A política e a economia não eliminam a poesia e a verdade.” (Catherine Ruelle)
“Quando eu vejo essa juventude pegar os barcos e preferir se suicidar porque não tem as respostas para as suas angústias e o seu futuro, é preciso encontrar uma solução!” (Samba Félix Ndiaye)

VIII. Diáspora 4: para além do espaço, a utopia africana | Programa 19 (118’):



fotos: Bamako
Bamako, Abderrahmane Sissako, 2006, 118’
Esmagado pela dívida externa e pelo ajustamento estrutural imposto pelo FMI, o continente africano luta pela sua sobrevivência. Diante desse drama, representantes da sociedade civil africana entram com um processo contra as instituições financeiras internacionais (o Banco Mundial e o FMI). O processo acontece em Bamako, capital do Mali, no pátio de uma casa, no meio dos habitantes que se ocupam de seus afazeres, atentos ou indiferentes ao debate. Entre eles estão Chaka e Melé. Ela é cantora em um bar, ele é desempregado, o casamento deles está se desgastando…
Bamako é um filme sobre a palavra. “Fala-se muito da África e ela fala muito pouco de si mesma”2, afirma Sissako. E é esta constatação que marca a diferença do peso das palavras no julgamento encenado no filme: se em todos os filmes de processo, as palavras são uma arma, em Bamako esta verdade ganha uma dimensão política. O processo é a oportunidade de uma tomada de palavra, e é através das palavras dos africanos, das testemunhas e dos magistrados que vêm ao banco dos réus, que uma África diferente se ergue: “uma África não somente de guerras e fome, mas também uma África que é consciente do que lhe acontece”, como declarou Abderrahmane Sissako3.

Grande prêmio do público no Festival Paris Cinéma 2006; Prêmio Especial do Júri JCC 2006

IX. África no feminino | Programa 20 (110’):

Rostos de mulheres, Désiré Écaré, 1984, 110’
Na zona rural da Costa do Marfim, Nguessan, casada com um homem que ela não ama, apaixona-se pelo irmão mais novo de seu marido que está voltando da capital. Uma outra mulher da aldeia, Fanta, está também atraída pelo rapaz. Para se defender do marido ciumento, ela aprende karatê. Em Abidjan, Bernadette, uma mulher inteligente, dirige um negócio de peixe seco, mas ela se dá conta de que as pessoas do seu entorno se aproveitam um pouco demais das benfeitorias que ela realiza. Três retratos que, de modo humorado, mostram a luta cotidiana das mulheres africanas para obter um lugar digno na sociedade. 
“Filmado em pedaços, com anos de intervalo, por falta de dinheiro, o filme contém uma sequência cult, uma cena de amor aquático magnificamente erótica!” (Catherine Ruelle)  
Prêmio da Federação Internacional de Crítica Cinematográfica em Cannes, 1985.

Programa 21 (105’):

Finzan, Cheikh Oumar Sissoko, 1989, 105’
Segundo a tradição bambara, Nanuyma se casou com 15 anos de idade, contra sua vontade, com um homem que tinha 45. Este último morre. Ela se confronta mais uma vez ao costume que prega que a viúva tem que se casar com um de seus cunhados. Ela se revolta, assim como Fily, jovem da mesma aldeia que as mulheres querem submeter à excisão, também em nome da tradição.   

Programa 22 (124’):

Moolaade, Ousmane Sembene, 2004, 124’ 
A poucos dias da cerimônia da Salinde, durante a qual todas as garotinhas da aldeia com idades entre 5 e 10 anos são submetidas à excisão, seis dentre elas fogem para escapar da operação. Quatro se refugiam na casa de Collé Ardo, uma mulher da aldeia, feroz opositora desta prática, que, sete anos antes, recusou-se a deixar sua filha, Amatsou, ser submetida à excisão. As mães das fugitivas e as sacerdotisas encarregadas da excisão sitiam a casa de Collé, pedindo suas filhas, mas Collé recusa-se a entregá-las. 
Prêmio “Un certain regard” - Cannes 2004; Prêmio especial do júri no Festival de Marrakech 2004.

X. África rural: mitos e tradições | Programa 23 (98’):

Carta camponesa, Safi Faye, 1975, 98’ 

Carta camponesa é o primeiro longa-metragem dirigido por uma mulher africana. 

Ngor e Coumba moram em uma pequena aldeia no Senegal. Faz dois anos que Ngor deseja se casar com Coumba. E este ano, novamente, a colheita é ruim… As chuvas são insuficientes, irregulares. O amendoim, cultura colonial, a única comercializável, só é colhido uma vez por ano. “A visão militante de Safi Faye consiste em afirmar uma política do cotidiano sem por isso deixar de abordar as questões econômicas: os problemas gerados pela monocultura do amendoim são discutidos sob a ´arbre à palabres’ [árvore em cuja sombra os antigos se reúnem para conversar]. Podia-se confiar nos brancos do Fundo Europeu de Desenvolvimento?” (Olivier Barlet)

Programa 24 (113’):

Fad’Jal, Safi Faye, 1979, 113’
Continuação de Carta Camponesa, Fad’jal é uma crônica de uma aldeia situada na região produtora de amendoim do Senegal. Os aldeãos testemunham, através da palavra dos antigos, transmitida pela tradição oral, a história da aldeia e as dificuldades que eles têm para cultivar a terra e se alimentar de sua produção. 

Programa 25 (106’):

Yeelen, Souleymane Cissé, 1987, 106’ 
Niamankoro tinha sido escondido pela sua mãe para que seu pai não o matasse. Quando se torna adulto, ele deixa a mãe e empreende uma longa viagem iniciática cuja conclusão lhe dará poderes mágicos. 
Yeleen foi feito, em parte, contra os filmes etnográficos europeus. Eu quis responder a um olhar exterior, a um olhar de sábios e técnicos brancos, a um olhar estrangeiro.” (Souleymane Cissé)
Prêmio do Júri no Festival de Cannes de1987.

Programa 26 (81’):

Tilai, Idrissa Ouedraogo, 1990, 81’
Saga volta a sua aldeia depois de dois anos de ausência. Muitas coisas mudaram. Sua noiva Nogma tornou-se a segunda mulher de seu pai. Mas Saga e Nogma continuam se amando. Transgredindo as leis, os dois têm uma aventura. Para a aldeia, isso é um incesto e Saga deve morrer. Kougri é designado para matá-lo. Mas ele deixa Saga escapar. Saga refugia-se na casa de uma tia e Nogma vem encontrá-lo. Eles vivem felizes até o dia em que Saga descobre que sua mãe está morrendo e decide voltar à aldeia.   
Grande prêmio no Festival de Cannes de 1990; Prêmio Sementais de Yennenga; Prêmio de melhor música - FESPACO 1991.

Programa 27 (99’):

Buud Yam, Gaston Kaboré, 1997, 99’
Encontrado na mata, quase morto, quando era criança, Ween Kuuni foi adotado por uma família. Ainda que ele tenha sido aceito pela comunidade da aldeia, ele continua a ser tratado como um estrangeiro. Mas a vida em família é serena até o dia em que Poghnéré, sua irmã adotiva, fica gravemente doente. Ween Kuuni parte à procura de um curandeiro lendário para salvar a sua irmã da morte. Ele deixa, então, sua aldeia de adoção e começa um percurso iniciático que lhe conduzirá até suas próprias raízes. 
“A busca da identidade, da memória, da compreensão de nossa trajetória histórica, é a única maneira, para mim, de apreender o nosso presente e de construí-lo. Eu não acredito que a identidade seja algo de estático a ser redescoberto; ela é uma alavanca que permite reformular a cada dia um questionamento fundamental: ‘quem somos?’” (Gaston Kabouré)
Prêmio Sementais de Yennenga no Fespaco de 1976; Tanit de Prata nas Jornadas Cinematográficas de Cartage (JCC) de 1976; Grande prêmio George Sadoul 1975; 1º Prêmio da Organização Católica Internacional do Cinema em Ouagadougou, em 1976; Grande Prêmio no Festival Internacional do Filme do Conjunto Francófono em Genebra, em 1975; Seleção oficial na Bienal de Arte Cinematográfica de Veneza, em 1975.

Programa 28 (89’):

Muna Moto, Jean-Pierre Dikongué-Pipa, 1974, 89’
Ngando e Ndomé  se amam. Ngando pede Ndomé em casamento mas a família de Ndomé  o lembra de que ele deve pagar o dote. Órfão, ele pede ajuda ao tio, que, já casado com três mulheres estéreis, decide se casar com a jovem, que espera um filho de Ngando. Desesperado, o rapaz, no dia da festa tradicional do Ngondo, sequestra sua própria filha.
Muna Moto faz “parte, indubitavelmente, dos filmes que marcaram a história do cinema camaronense e, nesse sentido, mesmo que não tenha sido exibido em toda a África, pode ser erigido ao posto de clássico do cinema africano.” (Thierry Sinda)
Prêmio Sementais de Yennenga – Fespaco, 1976 ; Tanit de prata nas Journées cinématographiques de Cartage (JCC), 1976 ; Grande prêmio George Sadoul, 1975 ; Primeiro Prêmio da Organização Católica Internacional do Cinema – Ouagadougou, 1976 ; Grande Prêmio Festival Internacional do Filme Francófono – Genebra, 1975 ; Seleção Oficial da Bienal de Arte Cinematográfica – Veneza, 1975. 

XI. África urbana: entre tradição e modernidade, novos conflitos internos | Programa 29 (105’):

A ordem de pagamento, Ousmane Sembene, 1968, 105’ 
Em um bairro popular de Dakar, Ibrahim, pai de uma grande família, desempregado, recebe uma ordem de pagamento de seu sobrinho, operário na França. Para sacar o dinheiro, ele precisa obter um documento de identidade. Ingênuo, Ibrahim se perde no labirinto das formalidades administrativas para, finalmente, ver sua ordem de pagamento “voar”. 
“É a burguesia senegalesa que eu quis denunciar, de uma maneira brechtiana. Uma burguesia de um tipo um pouco especial, composta de intelectuais e administradores que se utilizam de seus saberes para esmagar o povo.” (Ousmane Sembene)

Programa 30 (123’):

Xala, Ousmane Sembene, 1975, 123’ 
El Hadji Abdou Kader Beye, homem de negócios senegalês, quinquagenário, casa-se com uma terceira esposa, sinal de sucesso social e, sobretudo, econômico. Seguindo a tradição muçulmana, ele tem meios financeiros para assegurar uma vida luxuosa às suas três mulheres, cada uma em sua mansão. À noite, é impossível consumar a união: ele é atingido pela impotência. Ele acreditar ser vítima de uma maldição, o xala, lançado por um camponês que ele tinha arruinado. El Hadji, humilhado, consulta os marabus. 
“Xala é, de uma certa maneira, a narrativa de uma história verdadeira: a história das atuais burguesias do terceiro mundo, cujos representantes, depois de terem combatido no passado o colonialismo francês, inglês ou americano, às vezes nas linhas de frente, se constituíram depois das independências numa nova classe que só sabe imitar as burguesias ocidentais”. (Ousmane Sembene)

Programa 31 (93’):

Baara, Souleymane Cissé, 1978, 93’
Um jovem camponês maliano trabalha como “baara”, ou seja, carregador, em Bamako. Um dia, ele simpatiza com um jovem engenheiro. Este último toma-o sob sua proteção, ajuda-o a resolver sua situação com a polícia e abandonar o mundo da marginalidade para entrar na usina. O engenheiro, que fez seus estudos na Europa, tenta aplicar suas idéias liberais dentro da usina. Contra o sindicato vendido ao patrão, ele faz o papel do verdadeiro líder sindical e entra em conflito com seu chefe. 
Prêmio Sementais de Yennenga no FESPACO de 1979; Tanit de Ouro, Grande Prêmio da Humanidade e Prêmio da melhor interpretação masculina nas VII Jornadas Cinematográficas de Cartago; Grande Prêmio do júri, Prêmio da Imprensa, FIFEF Namur; Grande Prêmio de melhor fotografia e menção especial da OCIC no 31o Festival de Locarno.

Programa 32 (105’):

Finyé,  Souleymane Cissé, 1982, 105’
Dois adolescentes malianos, Bah e Batrou, provenientes de meios sociais diferentes, encontram-se no colégio. Bah é o descendente de um grande chefe tradicional. O pai de Batrou, governante militar, representa o novo poder. Os dois adolescentes, por sua vez, pertencem a uma geração que recusa a ordem estabelecida e questiona a sociedade. 
Prêmio Sementais de Yenenga no Fespaco de 1983.


XII. As guerras civis: o desafio da memória diante das fissuras nacionais | Programa 33 (68’):

Ruanda  in memoriam, Samba Félix N’Diaye, 2003, 68’
Entre abril e julho de 1994, o massacre dos Tutsis e Hutus moderados fez um milhão de mortos. Por iniciativa do Fest’África, uma dezena de autores africanos se encontraram para escrever um projeto em Kigali, quatro anos depois dos acontecimentos, buscando quebrar o silêncio dos intelectuais africanos sobre o genocídio. Em maio de 2000, na ocasião da publicação de uma série de obras inspiradas nessa experiência, escritores e artistas da África e de outras partes se reuniram em Ruanda. Confrontado aos vestígios do genocídio, Samba Félix N’Diaye soube achar a distância justa para filmar o inominável, passando, ao mesmo tempo, uma mensagem de esperança. 
“Este filme é uma ode à vida. E assim sendo, é um requisitório contra aqueles que utilizam a morte para manipular os vivos”. (Olivier Barlet)

XIII. Programação Infantil | Programa 34 (90’):

Yaaba, Idrissa Ouedraogo, 1989, 90’ 
Yaaba, em more, significa avó. É o nome que Bila, um garoto que vive em uma aldeia do Burkina Faso com sua amiga Napoko, dá a Sana, uma velha mulher abandonada e rejeitada por toda a aldeia. Uma profunda amizade cresce entre Yaaba e as duas crianças. 
“Lindamente filmada, a amizade dessas duas crianças e dessa senhora nos remete a nossos próprios demônios sobre a velhice e a exclusão. O rosto dessa velha mulher, rosto-paisagem, tem uma beleza e uma dignidade inesquecíveis”. (Catherine Ruelle)
Prêmio do Público e Prêmio da Melhor Música no Fespaco de 1989.

Programa 35 (93’):

A bola de ouro, Cheik Doukouré, 1993, 93’
Bandian tem 12 anos. Na sua aldeia, em plena mata da Guiné, ele é de longe o melhor jogador de futebol. Ele sonha em, um dia, ganhar a “Bola de Ouro”, troféu que recompensa o melhor jogador de futebol africano. Quando Isabele, jovem médica dos Médicos Sem Fronteiras, oferece-lhe uma bola de verdade, sua vida será transformada para sempre. 
“Uma história carregada de sentido, uma direção impecável, emoção, sentimento, belas imagens... Resultado: um filme hiper-popular, que passa continuamente em todos os programas infanto-juvenis da França desde seu lançamento.” (Catherine Ruelle)

Programa 36 (101’):

Keita, a herança do griô, Dani Kouyaté, 1995, 101’
“Abra bem seus ouvidos e escute atentamente… Tudo começou com a desilusão de uma pobre antílope…” Quem conta essa história é Djéliba Kouyaté. No crepúsculo de sua vida, este velho griô quer a todo custo contar ao jovem Mabo Keita a origem de seu nome. Um nome que evoca toda uma epopéia, a epopéia do fundador do Empério Mandingue, Sundjata Keita, o filho da mulher búfala, feia e corcunda. O imaginário de Mabo faz renascer este décimo terceiro século lendário. Cativado pela história, ele mata aula para escutar melhor o velho griô. É claro que problemas existirão, mas a história seguirá seu curso… 
Prêmio Oumarou Ganda no FESPACO de 1995

Programa 37 (108’):

A pequena vendedora de sol, Djibril Diop-Mambéty, 1998, 44’
Há muito tempo, as vendas de jornal nas ruas de Dakar é um trabalho para os garotos. Mas hoje, Sili, uma garota de doze anos, que vive nas ruas e se desloca com a ajuda de muletas, decidiu, depois de ser violentamente empurrada pelos meninos, vender jornais como todo mundo. Este mundinho de vendedores de jornal é impiedoso; ela encontrará a dor, mas também o sonho e a amizade. 
“Em A pequena vendedora de sol, Djibril Diop-Mambéty permanece muito perto da realidade de sua cidade e de seus compatriotas. Recusando as acrobacias da câmera e os efeitos fílmicos, ele constrói uma obra pioneira com este filme de grande simplicidade e de uma maravilhosa poesia”. (Anny Wychank)

Tesouro das lixeiras, Samba Félix N’Diaye, 1989, 64’
Série de cinco documentários mostrando a capacidade dos artesãos em criar obras de arte a partir dos materiais mais simples. Trata-se de um inventário das táticas de sobrevivência que as pessoas simples desenvolvem com poesia e criatividade. Ao documentá-las, Samba Félix N’Diaye, o mais proeminente dos documentaristas africanos, compõe uma bela poética do cotidiano.
“Seu interesse reside tanto nas ações e objetos filmados quanto na maneira como Dakar é representada através da vida cotidiana dos personagens”. (Baya Sékhraoui)

XIV. O cinema em questão | Programa 38 (49’):





















O retorno de um aventureiro, Mustapha Alassane, 1966, 34’
De volta de uma viagem aos Estados Unidos, um jovem nigeriano oferece fantasias de caubói aos amigos de sua aldeia. O pequeno bando vai perturbar a aldeia e transformá-la numa cidade de faroeste. 
Este filme é “uma paródia de western e não um western africano, como já disseram algumas vezes. Eu tentei realizar nesse filme a etnografia das atitudes que encontramos hoje na África, como o mimetismo. A influência do cinema americano é tão forte no Niger que os jovens reagem frequentemente por identificação: querem ser iguais aos caubóis que se veem no universo de sonho das telas”. (Mustapha Alassane)

Os caubóis são negros, Serge-Henri Moati, 1966, 15’ 
Mustapha Alassane, cineasta nigeriano, filma O retorno de um aventureiro, primeiro western africano. Os caubóis são negros conta a filmagem desse filme de ação e de amor e nos mostra o quanto a fronteira entre a realidade e a ficção, o cinema e a vida, é estreita.

ÁFRICA SOBRE O SENA : OS PRIMEIROS PASSOS DO CINEMA AFRICANO


foto: África sobre o Sena
Até os anos 60, na África negra francófona, um decreto, outorgado em 1934 por Pierre Leval, então Ministro das Colônias, impunha uma autorização administrativa para filmar nesse território. Em termos práticos, tal decreto somava-se às dificuldades e interditos à auto-representação que condenavam os africanos ao retrato ideológico dos missionários, dos cineastas coloniais, dos etnólogos. O primeiro filme realizado por um cineasta africano, África sobr o Sena, de Paulin Soumanou Vieyra, Jacques Mélo Kane, Mamadou Sarr et Robert Caristan, só apareceu em 1957, mais de meio século depois da invenção dos irmãos Lumière.  É esse fato que faz da cinematografia africana a mais jovem cinematgrafia do mundo. Realizado em Paris, na falta de uma autorização para filmar nos países de origem dos cineastas, África sobr o Sena narra a rotina de estudantes africanos migrantes que tentam construir uma vida na capital francesa. No final, uma imagem “furtada”, que mostra crianças brincando em um rio do Senegal, aparece como a força do interdito e do que ele proíbe.

África sobre o Sena será exibido no dia 27/10/2009, na Aliança Francesa, às 18h. Reprise dia 31/10, 16h, na Aliança Francesa.